ALTERAÇÕES SENIS DO TECIDO MUSCULAR

 

 

I— Anatomia histológica do músculo e fisiologia muscular


Os músculos esqueléticos são também denominados voluntários porque a sua acção está sob o domínio da nossa vontade, o que não sucede com os músculos viscerais, que actuam automaticamente.
A sua estrutura também difere, sendo os primeiros constituidos por fibras estriadas e os segundos por fibras lisas, à excepção do coração que é também um músculo estriado.
As fibras estriadas têm cerca de 4 a 6 centímetros de comprimento e espessura muito variável. São revestidas por uma delgadíssima camada de tecido conjuntivo laxo e aglomeram-se em feixes, mais ou menos volumosos, separados por tecido conjuntivo que contém artérias, veias, nervos e canais linfáticos.
Como veremos, esta estrutura é particularmente afectada pelo envelhecimento, por fibrose intersticial do tecido conjuntivo.
A fibra muscular contém fibrilhas que se dispõem longitudinalmente  e constituem a parte contráctil, envolvidas por uma substância amorfa, rica em núcleos, o sarcoplasma, não contráctil e encarregue da nutrição muscular (fig 4. ).

 

As fibrilhas apresentam estrias transversais que no seu conjunto dão ao músculo, visto ao microscópio, o aspecto característico estriado transversalmente.
O aspecto estriado corresponde a uma alternância em cada fibrilha de discos escuros, contrácteis, e de discos claros, elásticos, cuja elasticidade se acrescenta à potência da contracção e promove a descontracção (fig. 5).
Os produtos das transformações bioquímicas que acompanham a contracção muscular (metabólitos) são transformados no sarcoplasma de forma a poderem ser de novo utilizados em contracções subsequentes (ressíntese). Também nos discos claros este fenómeno se passa, dando-se por isso ao sarcoplasma e aos discos claros o nome de território de fadiga. Com efeito, se essas substâncias, nomeadamente o ácido láctico, se acumularem no

 

 

 

 

sarcoplasma e nos discos claros, o que sucede em exercícios muito rápidos e violentos, o músculo perde gradualmente a capacidade contráctil e a elasticidade, entrando em rigidez de fadiga.
A ressíntese só é possível em presença do oxigénio e toda a actividade muscular cessa, por conseguinte, se este não for convenientemente fornecido aos músculos.
A recuperação do estado de fadiga faz-se mais rápida ou mais lentamente consoante a idade e o treino físico.
Os músculos são muito ricos em vasos sanguíneos, que lhes asseguram as enormes necessidades de circulação durante a actividade, cerca de dez vezes mais intensa que durante o repouso.
Os metabólitos da contracção, quando produzidos em abundância, passam do território de fadiga para a circulação geral e, como são vaso-dilatadores, contribuem para intensificar a circulação em todos os tecidos, durante o exercício muscular.
Por sua vez, o ácido láctico combina-se com o bicarbonato do plasma, libertando grandes quantidades de anidrido carbónico o que excita consideravelmente a ventilação pulmonar.

Estes fenómenos fisiológicos adquirem feição especial no organismo do mais idoso.
As contracções musculares voluntárias são provocadas por estímulos nervosos que partem dos neurones motores cerebrais e caminham por fibras nervosas até às células nervosas motoras da espinhal-medula. Destas o estímulo nervoso segue por fibras que penetram nos músculos, onde se dividem em numerosos filamentos que terminam nas fibras musculares em pequenos corpúsculos chamados placas motoras.
Cada fibra nervosa inerva um número variável de fibras musculares, por vezes mais de cem.
O percurso do estímulo nervoso desde os neurones motores cerebrais até aos músculos da extremidade dos membros inferiores, ultrapassa consideravelmente um metro, consoante a estatura do indivíduo.
A sensibilidade muscular é assegurada por formações anatómicas que têm o nome de fusos neuro-musculares, donde partem estímulos sensoriais até ao cérebro.
A sensibilidade dita idio-muscular é extremamente importante para nos assegurar a postura e a coordenação motora.
Uma contracção muscular simples, provocada por um único estímulo, o que pode dizer-se que só sucede experimental- mente, por estimulação artificial, designa-se por abalo muscular.
Qualquer movimento implica uma série de contracções musculares por segundo, que se associam provocando o tétano muscular, e que dá a aparência de uma simples contracção.
Se os abalos não se sucedem com a rapidez suficiente dá-se um tétano imperfeito e o movimento é trémulo e impreciso.

 

II — Alterações anatómicas e funcionais do músculo senil

Como é sabido, a inactividade muscular prolongada provoca atrofia musçular, em qualquer fase da vida.

Os músculos, cuja circulação de repouso é muito reduzida, vão diminuindo gradualmente de volume, por perda de água e de sarcoplasma e empobrecimento fibrilhar, embora o número de fibras se mantenha constante e constitua uma característica individual.
Na pessoa de idade avançada, a hiponutrição, qualitativa e quantitativa, a sedentariedade, a limitação motora ou imobilização por artrose e rigidez peri-articular… conduzem a atrofias musculares, por vezes impressionantes, a que se associam alterações anatómicas e funcionais específicas que vamos descrever:
O envelhecimento provoca em todos os indivíduos, mas nos sedentários mais rápida e intensamente do que nos activos, espressamento e rigidez dos septos conjuntivos que separam os feixes de fibras musculares, por aumento de fibras colagéneas inextensíveis.
Instala-se deste modo o processo de fibrose senil intramuscular, cuja retracção vai dar lugar ao encurtamento dos músculos e constitui obstáculo mecânico tanto à contracção como à descontracção. Pelo mesmo motivo se dá a compressão dos vasos sanguíneos dificultando-se a circulação em ambos os sentidos, com desnutrição acentuada do tecido muscular e atrofia subsequente, em que predomina a perda do sarcoplasma.

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Assim, dá-se a redução do território de fadiga, o que vai ter grandes repercussões no comportamento físico do idoso, quer na fadiga local quer na resistência ao exercício.
A saturação do território de fadiga pelos metabólitos da contracção, processa-se rapidamente dando lugar à incapacidade motora em poucos instantes. Por seu turno e pelo mesmo motivo de escassês de sarcoplasma, a recuperação de fadiga é mais lenta. Compreende-se que nestas circunstâncias, em qualquer exigência de esforço, sobretudo em velocidade, entrem na circulação geral metabólitos que libertam quantidades de anidrido carbónico suficientes para provocar dispneia. Isso explica o cansaço fácil do idoso inactivo quando tenta acções rápidas.

 

III — Fenómenos nervosos


Na pessoa de idade mais avançada o impulso motor voluntário, partido dos neurones cerebrais, é normal, embora atenuado.
A explicação do facto reside em complicadas inter-relações de vários sectores nervosos, de que depende o chamado estado central do neurone motor e do número destes que são solicitados para o acto mecânico.
Também a velocidade da condução nervosa do estímulo motor é mais lenta do que na pessoa jovem.
O desencadear do gesto motor torna-se, portanto, mais lento, e a sua prontidão e precisão nem sempre são as desejadas.
No fenómeno está também em causa a componente sensitiva, igualmente afectada, tanto na sua condução centrípta como na sua percepção pelas células cerebrais.
Destas deficiências, num e noutro sentido, resulta que o tétano muscular nem sempre é perfeito, o gesto motor resulta trémulo, há perturbações na coordenação motora.
Estas situações podem ocorrer mesmo na ausência de estados de insuficiência cerebral, a que muitas vezes estão associadas , sendo, em grande parte, apenas produto de carência de impulsos tonígenos que sobre o sistema nervoso o exercício físico pode determinar e, por conseguinte, ainda reversíveis. Vemos, com efeito, que uma actividade muscular bem orientada pode normalizar estes transtornos da motricidade e da função nervosa.


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